Como todo ensaio, é uma obra aberta. Talvez porque seja impossível para um escritor desenvolver um Tratado. A literatura se parece muito com a psicologia: sua base é a subjetividade.
Saramago é um gênio, e o ser humano um tema sem limites para digressões, sem regras, cheio de surpresas e encantos. O ser humano, ser que supera em si toda e qualquer espectativa ou perpectiva.
Nesta delicada e arrebatadora obra, o autor nos faz refletir sobre o quão frágeis e instáveis são os pilares sobre os quais edificamos nossa sociedade, o quão tênue é a linha que delimita nossa estabilidade emocional, em verdade: qual estabilidade? Diante do caos, o quanto do nosso ser animal temos que trazer a tona em nome da sobrevivência. E vestidos com a bandeira da luta pela sobrevivência, o quanto de maldade somos capazes de realizar. E essa maldade é animal? Mas diante da tragédia consola-nos pensar em o quanto nossa alma ainda pode lembrar das outras almas, do outro ser.
Na obra de Saramago, a humanização chega com o respeito e o cuidado pelo outro. Redescobre-se o sentido e a necessidade existirmos com o outro, para o outro, pelo outro e por nós mesmo: liberdade é co-existirmos.
E nos sentimos um pouco aliviados com nossa cegueira branca, pois é sempre doloroso encarar com esse lado negro que existe ainda em todos nós.