terça-feira, 13 de setembro de 2016

CONSELHOS PARA A MULHER FORTE




CONSELHOS PARA A MULHER FORTE
(Gioconda Belli, Nicarágua, 1948)
Se és uma mulher forte
te protejas das hordas que desejarão
almoçar teu coração.
Elas usam todos os disfarces dos carnavais da terra:
se vestem como culpas, como oportunidades, como preços que se precisa pagar.
Te cutucam a alma; metem o aço de seus olhares ou de seus prantos
até o mais profundo do magma de tua essência
não para alumbrar-se com teu fogo
senão para apagar a paixão
a erudição de tuas fantasias.
Se és uma mulher forte
tens que saber que o ar que te nutre
carrega também parasitas, varejeiras,
miúdos insetos que buscarão se alojar em teu sangue
e se nutrir do quanto é sólido e grande em ti.
Não percas a compaixão, mas teme tudo que te conduz
a negar-te a palavra, a esconder quem és,
tudo que te obrigue a abrandar-se
e te prometa um reino terrestre em troca
de um sorriso complacente.
Se és uma mulher forte
prepara-te para a batalha:
aprende a estar sozinha
a dormir na mais absoluta escuridão sem medo
que ninguém te lance cordas quando rugir a tormenta
a nadar contra a corrente.
Treine-se nos ofícios da reflexão e do intelecto.
Lê, faz o amor a ti mesma, constrói teu castelo
o rodeia de fossos profundos
mas lhe faça amplas portas e janelas.
É fundamental que cultives enormes amizades
que os que te rodeiam e queiram saibam o que és
que te faças um círculo de fogueiras e acendas no centro de tua habitação
uma estufa sempre ardente de onde se mantenha o fervor de teus sonhos.
Se és uma mulher forte
se proteja com palavras e árvores
e invoca a memória de mulheres antigas.
Saberás que és um campo magnético
até onde viajarão uivando os pregos enferrujados
e o óxido mortal de todos os naufrágios.
Ampara, mas te ampara primeiro.
Guarda as distâncias.
Te constrói. Te cuida.
Entesoura teu poder.
O defenda.
O faça por você.
Te peço em nome de todas nós.

domingo, 4 de setembro de 2016

REDES: um conceito que precisa ser difundido e aprofundado




Redes como Sistemas de Interação Social

O conceito de rede é pensado, muitas vezes, como um tipo de sistema de inter-relação social diferente do grupo, por diversas características. Apesar de algumas divergências teóricas, o principal aspecto definidor do que seria uma rede é a sua capacidade de articulação e rearticulação permanente.
As práticas interativas são o motor da produção da cultura, fazendo com que existam múltiplas possibilidades de arranjos e negociações, dependendo do potencial de contatos e fronteiras que os agentes sociais envolvidos em tais processos podem estabelecer. Nesse sentido, seria impossível perceber a sociedade como uma unidade fechada, com suas características dadas, mas sim como um processo permanente de interações sociais e culturais, em que estas seriam constantemente construídas e desconstruídas, obedecendo a demandas contextuais.
As redes podem ser pensadas em sentidos diversos: ou com o sistema de integração entre pessoas, mediante práticas de interação, em um sentido mais social; ou como um sistema de troca de mercadorias e bens materiais, em um sentido mais econômico; ou como trocas de informações e bens simbólicos, em um sentido mais cultural.
A globalização traz, como um dos seus efeitos mais perceptíveis, a possibilidade de se estabelecer explicitamente sistemas de interação social em rede, em que sujeitos, através de links, participam de trocas econômicas e culturais em amplas escalas, que extrapolam limites espaciais e temporais antes rígidos.
Não há dúvida, portanto, de que a ideia de uma sociedade em rede, a partir das transformações citadas acima, é pertinente e adequada aos estudos sobre as sociedades contemporâneas. No entanto, ele vem sendo tratado como dado, sem qualquer esforço de localizá-lo historicamente e mesmo de conceituá-lo minimamente. Há, portanto, um uso generalizante do conceito que só tende a esvaziá-lo, em detrimento de sua riqueza e adequação.
O que poderíamos destacar, no caso contemporâneo, em face do processo de globalização, é a expansão da rede, sua potencialização ampliada e sua explicitação. Nesse sentido, o conceito é muito pertinente, pois trata-se, sem dúvida, de uma conjuntura histórica em que os sentidos propostos para o conceito de rede (interação entre indivíduos, troca de mercadorias e fluxo de informações) estão evidenciados e acabam ocupando u m lugar central na configuração cultural, política, econômica e social. Mas é preciso cuidado para não cairmos em um reducionismo histórico, negando o quanto as questões que hoje nos inquietam fazem parte de um processo de longa duração.

Fonte: http://www.revistas.ufg.br/ci/article/viewFile/24452/15165